26.05.22

Mais de 140 crianças com doenças crônicas voltaram para casa após mães serem treinadas no Martagão

Mais de 140 crianças com doenças crônicas voltaram para casa após mães serem treinadas no Martagão

A lavradora Luciete Santana, 39, tinha o sonho de poder ir para casa com sua filha, Emily, 6. Com paralisia cerebral, a menina, que depende de aparelhos para se alimentar e respirar, precisou ficar internada por quase um ano até que sua mãe fosse treinada por profissionais da Unidade de Treinamento de Desospitalização (UTD) do Martagão Gesteira e, assim, pudessem retornar para casa.

O caso de Emily é semelhante ao de mais de 140 crianças portadoras de doenças crônicas que, nos últimos dez anos, receberam alta e puderam voltar para casa sem terem seus tratamentos interrompidos. Todas foram pacientes da UTD do Martagão, setor do hospital que treina mães e pais para poderem cuidar dos próprios filhos.

Nesta quarta-feira, 25, a UTD, única do estado e referência do país, completa 10 anos. Caso as mães desses pacientes não fossem treinadas pelo setor, elas teriam que acompanhar seus filhos internados sem previsão de alta e praticamente “morar” no hospital, afastando-se de outros filhos, familiares e amigos.

Na maioria dos casos, são situações de pacientes com longo tempo de permanência em UTI’s, que dependem de ventilação mecânica e que passam a poder retornar para seus lares mesmo precisando de tecnologias avançadas para sobreviver. Já houve casos de pacientes, por exemplo, que ficaram internados por quase dois anos.

Moradora de Jeremoabo, Luciete Santana conta que trouxe a filha para Salvador, para fazer um exame. “Descobrimos que ela tinha leucemia, foi para a UTI em outro hospital, mas pegou uma infecção. O quadro evoluiu para paralisia cerebral. Em seguida, foi transferida para o Martagão. Eu praticamente morava no hospital. Não saia de perto da minha filha. Tive que ficar em Salvador e me afastei da minha família”, relata.

Na UTD, as mães são treinadas durante meses para poderem dar continuidade à assistência dessas crianças, que permanecem sendo acompanhadas pelo hospital, quando residentes em Salvador e Região Metropolitana.

Alta – O operador de máquina Adriano Santiago, 36, é pai do pequeno Théo de Souza, 8 meses. Por causa de complicações na hora do parto, o bebê sofreu com falta de oxigênio no cérebro e foi direto para a UTI. “Meu filho nasceu todo roxo e teve a cabeça deformada. Com dias de nascido, a gente veio para o Martagão. Ele depende de máquina para respirar e se alimentar. Tive que me afastar de tudo. Minha família hoje é a equipe do hospital”, diz.

Desempregado, Adriano conta que a prioridade de sua vida passou a ser o filho, o primeiro do casal. “O nosso propósito aqui é ser treinado e ir para casa com meu filho. Eu olho para ele e só vejo coisas positivas. Dou massagem, brinco. Se hoje ele está aqui, é por causa de Deus. É um milagre”.

Assim como Adriano, outras 19 famílias estão sendo treinadas na UTD para serem desospitalizadas – a maioria absoluta são mães que acompanham seus filhos. “Este programa é de extrema importância para as famílias, pois possibilita a reinserção social do paciente no leito familiar, promovendo humanização, segurança e autonomia do cuidador”, ressalta a enfermeira líder da UTD, Rebeca Abbud.

Criada em 25 de maio de 2012, a UTD foi idealizada pelo próprio Martagão, em parceria com a Secretaria de Saúde do Estado da Bahia (Sesab). Com 20 leitos, a UTD recebe crianças de todo o estado, que são encaminhadas via Central Estadual de Regulação. Em todos os processos, é feita uma avaliação do paciente para verificar se ele está num quadro estável de saúde, que permita esse retorno para casa.

“Apesar das dificuldades financeiras que sempre enfrentou e que continua enfrentando, com um déficit mensal de R$ 700 mil, o Martagão sempre busca oferecer à população serviços pioneiros e de qualidade e que, de fato, ajudam a mudar para melhor a vida de milhares de crianças baianas”, ressalta o presidente da Liga Álvaro Bahia (mantenedora do Martagão), Carlos Emanuel Melo.

A UTD possibilitou, ainda, que os leitos da rede pública de saúde que essas crianças ocupariam, caso a unidade não fosse criada, pudessem ser utilizados para pacientes acometidos por outras doenças, ajudando, assim, a desafogar a ocupação hospitalar.